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Bonamondo, o planeta dos sonhos - Capítulo 1

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  Havia dois sóis no planeta Bonamondo. O azul, enorme e pungente, dominava o céu. O avermelhado, de brilho tênue, aparecia por poucas horas nos finais de tarde e tornava mais belas as luzes do arrebol. Tessat o adorava, chamava-o de pequenino simpático . Admirava também o azulão e se esbaldava com o calor que ele proporcionava. À noite, três luas apareciam, porém apenas uma delas tornava-se inteiramente visível em algumas ocasiões. As outras duas sumiam por dias, às vezes por semanas e, quando regressavam, jamais se mostravam por inteiro. A lua de sempre , como a chamava Tessat, era branca e brilhante. Para o garoto, ela era feita de gelo. A irmã dizia-lhe que isso é improvável, pois o calor do azulão o derreteria, fazendo a lua minguar. Ele, no entanto, preferia continuar imaginando uma lua feita de enormes e vistosos blocos de gelo. Assim é muito mais legal , dizia a si mesmo. E, ao imaginá-la desta forma, sorria de contentamento, fazendo surgir em sua face um delicado efeito res

Vida como não a conhecíamos - Capítulo 1

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  Pedra da Macela (Cunha/SP) - Foto: Wikipedia Palco de batalhas sangrentas durante a Revolução Constitucionalista de 1932 e berço de heróis paulistas (a exemplo do lavrador Paulo Virgílio), Cunha é hoje uma estância climática pacífica e famosa pelos artesanatos em cerâmica e por suas belas paisagens. Uma cidade com ares bucólicos, localizada entre as Serras do Mar e da Bocaina, e que se desenvolve sem pressa entre morros, vales e campos de lavandas. É ali que um famoso neurocirurgião costuma relaxar quando o estresse, tão comum no dia a dia de um profissional da saúde, atinge níveis perigosos para alguém que precisa estar o tempo todo em perfeito equilíbrio. Estava sozinho em uma pequena praça, de frente a uma quadra poliesportiva, no final de um domingo frio de agosto, auge do inverno no hemisfério sul. Ao longe, enxergava o único campo de futebol da cidade, tão deserto e silencioso quanto tudo à sua volta. Mais ao fundo do cenário, construções recentes desafiam os aclives acentuados

O pedido de Deus

Sonhei com Deus esta noite, que surgiu à minha frente na forma de um emaranhado de luzes suaves. Fiquei perplexo. Havia tanta coisa para ser dita, tanto a ser perguntado, que eu não sabia por onde começar.  Lembro-me de ter feito pedidos genéricos pela paz, pelo amor e pelo fim da fome. Confesso que fiz também pedidos um tanto egoístas, pois relativos apenas a mim. Deus, entretanto, permaneceu em silêncio (talvez estivesse cansado de ouvir pedidos). O que espera de mim? – decidi perguntar. Sua resposta (uma voz feminina) ecoou em minha mente: “Construa”. – Uma arca? – perguntei, assustado. Foi então que conheci o sorriso de Deus. Um gargalhar espontâneo e gentil, que me proporcionou uma profunda sensação de acolhimento. “Construa o que ainda não foi construído, termine de construir o que está inacabado e reconstrua o que foi demolido. Ao construir, perceberá que suas necessidades pessoais serão preenchidas”. Deus suspirou em seguida. Pareceu-me, por um momento, um pouco entristecido(a)

Nazareth: Com 54 anos, banda mostra-se rejuvenescida em Surviving the law

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  Exatamente no primeiro minuto do dia 15 de abril de 2022, recebi um email da Apple informando que o álbum Surviving The Law (NAZARETH), que adquiri há algumas semanas, já se encontrava disponível.  Realizada a audição, vamos à resenha. “Try to stay away from the small talk”. É nesse clima de rebeldia e protesto, tão típico do rock ‘n’ roll, que se inicia a explosiva “Strange Days”, faixa de abertura do álbum “Surviving the Law”, o vigésimo quinto da veterana (e quase mitológica) banda escocesa NAZARETH. Um som moderno e energético, que tem feito a alegria dos antigos fãs e atraído a atenção de roqueiros mais jovens. “You Gotta Pass it Around” é mais melódica, quase uma balada, e também muito agradável de ser ouvida. Ela traz à lembrança a veia romântica, tão característica do NAZARETH de outros tempos. Uma nova alternância rítmica surge com a acelerada “Runaway”. O excelente vocal de Carl Sentance mostra-se em perfeita harmonia com os instrumentos e com os “backing vocals” dos

Conto: Projeto Ísis

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  Quase todos os dias, Clarice esgueirava-se pelas ruas penumbrosas daquele fétido vilarejo, observando cautelosamente as apáticas criaturas do lugar. Eram breves incursões; o medo a impedia de ir longe. Os seres que via eram estranhos e tinham modos primitivos.  Seria uma civilização alienígena em seus primeiros passos?  Clarice não fazia ideia. Só sabia que se sentia desconfortável perante eles. O que mais a incomodava era o cheiro: as criaturas exalavam um odor desagradável, que podia ser sentido mesmo a longa distância. E aquele pedaço de fim de mundo era a coisa mais suja e asquerosa que vira em toda sua vida! Para uma obsessiva compulsiva por limpeza, um cenário como aquele parecia ser o pior dos pesadelos. Um pesadelo que se tornara tão real quanto seus medos e manias. Ísis, sua nave improvisada, de alguma maneira a levara até ali. A construção daquela engenhoca era hoje o maior orgulho dos trinta e cinco anos de vida de Clarice. Foram árduos anos de trabalho até que o primeiro

Belchior, Drummond e a corrida espacial

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  Em  entrevista concedida para a Rádio Nacional FM do Rio de Janeiro , em 1979, Belchior observou que a belíssima Espacial, de sua autoria, "É uma música que relaciona a tecnologia sofisticadíssima da chegada do homem à Lua com o fato de nós sermos seres humanos frágeis e necessitarmos de coisas bastante primitivas como o pão, o amor, a convivência com as pessoas e  a linguagem ( https://soundcloud.com/ebcnarede/belchior-comenta-a-musica-espacial ).   Seus comentários trouxeram à minha lembrança o poema " O Homem; As Viagens ", de Drummond.    De acordo com Belchior, Espacial foi a primeira música que ele fez e apresentou para o público. Na época, o assunto 'exploração espacial' era muito abordado, como no clássico filme "2001, uma odisseia no espaço", baseado no livro de Arthur C. Clarke.   Nestes tempos em que se procura acelerar a exploração de Marte (o robô Perseverance acaba de pousar no planeta vermelho), Espacial parece ainda mais atual:    &quo

Restart

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  Uma manhã preguiçosa, o último dia do ano. 'Daquele ano' - o ano da pandemia. Olho para o céu, através da janela do meu quarto, e vejo nuvens acinzentadas movimentarem-se com suavidade e lentidão. Aparentam calmaria. O ano termina com imagens nubladas, mas que transmitem paz e serenidade. Um contraste com os sentimentos que têm preponderado entre nós. Ouço uma cantoria, ou algum tipo de comunicação, vinda dos ramos das árvores ao redor. Os pássaros estão agitados. Talvez eles sintam que há energias díspares a duelarem no éter. Roncos de escapamentos de motocicletas começar a soar. Fogos de artifício pipocam aqui e acolá, causando incômodo aos nossos ouvidos. Cães latem, assustados e temerosos. Volto novamente meus olhos para o alto e vejo que o Sol começa a encontrar espaços entre as nuvens. Ele quer fazer chegar até nós seus primeiros raios de 31 de dezembro. São raios tímidos, frágeis. Nossa estrela amiga parece cansada, mas não se esqueceu de nós. Acho que quer nos mostrar